segunda-feira, 26 de julho de 2010

Caleidoscópio XIII

Acompanhando a taquicardia, sentiu um tremor em suas mãos. Apesar do nervosismo, conseguiu achar engraçado o batimento cardíaco acelerado se compassar com a música que ouvia-se perto. Ficou parado alguns segundos com os olhos petrificados no conhecido artefato. Caminhou 7 ou 8 passos e de posse do pergaminho resolveu ir ao banheiro onde fizera o salto pela primeira vez. Entrou em no pequeno box e hesitou entre sentar ou não no vaso para ler. Em pé pensou que se estivesse em sua casa, sentaria. Desenrolou finalmente e leu:

Esse pergaminho só reaparece para você por mau uso.
Saiba como usar o caleidoscópio e não desperdice o seu tempo.

Duas frases curtas que o fizeram pensar. Ao menos, deixou o pergaminho na caixa d'água  do vaso sanitário, por saber que ele desapareceria. Pelo resto da tarde, concentração foi o foco inatingível. Sentia-se letárgico e quando finalmente deu a hora de ir, foi beber água na cozinha, enquanto promovia alguns simples alongamentos. Em seguida foi ao banheiro se perguntando o que estava fazendo de errado e entrou no mesmo box dos 3 que ficavam lado a lado, apenas para certificar-se que lá não mais estaria o pergaminho. Estava correto e pensou que ao menos já entendia melhor como acontecia algumas coisas.

Esse foi seu pensamento dominante enquanto dirigia. 


Mesmo no supermercado fazendo compras, ou em casa era o que estaria fazendo de errado. Já cama e ainda com tal pensamento, percebeu que o sono não vinha. Sua cabeça fervilhava. Seria capricho seu ficar saltando no tempo para ficar vendo partidas de futebol apenas por gostar? Quando o dia finalmente começava a clarear, adormeceu e quando o despertador tocou, sentia-se exausto, mas apesar de continuar com o pensamento a lhe martelar, conseguiu agir com muito mais foco. Tudo parecia normal e acompanhou os jogos da copa e decidiu-se que assistiria até o fim da copa sem dar mais nenhum salto no tempo, para finalmente voltar para 2002. Essa certeza deu uma guinada total em sua cabeça e no segundo jogo estava completamente esquecido dos pensamentos que lhe intrigaram por tanto tempo. O dia era absolutamente normal, com as pequenas coisas do dia acontecendo de uma forma natural. Até a ida ao banheiro era definitivamente normal. O problema foi que ao entrar no mesmo box (e por mero acaso dessa vez), Visualizou novamente o pergaminho. Milésimos de segundo antes da taquicardia visitar-lhe, disparou o grito pela faxineira:

— Duuuuuuulce.
— Pois não — Chegou arfando a pequena senhorinha que trabalhava ali.
— Esse banheiro foi limpo hoje? — Escondendo em seu bolso o pergaminho.
— Sim senhor. 7:30h, antes de vocês chegarem, mas me desculpe, o que foi que eu fiz?
Dois companheiros de trabalho chegavam para ver o que havia acontecido e ouviram-no responder:
— Nada Dulce. Nada demais. Quero apenas parabenizar você pelo serviço que você faz. Esse banheiro está impecável.

Era possível notar nos 3 um relaxamento muscular nos ombros. Ela agradeceu com um sorriso um tanto constrangido e ele pediu licença para usar o banheiro. Sua vontade de passar no banheiro que era até então real, pareceu sumir, mas ele pode notar algumas gotículas de urina no vaso ou no chão e um leve odor que desaprovava por completo a reação que havia tido. Se fosse ao menos no horário de entrada, mas o pergaminho pareceu pulverizar esse pensamento. Em menos de 24 horas estava com o objeto que acreditava que não mais veria. Desenrolou e leu uma única frase. Menor ainda e mais desconcertante.

Adiar o que deve ser feito é inteligente?

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